Acabo por não
saber se é esta espécie de silêncio que se envolve comigo quem, de algum modo,
me resguarda. O tempo guardado em nós lembra a ironia da paisagem morta ou a
insolência dos cactos que à míngua de água se obstinam; mas não os deuses que em
lugares imunes inventam rios felizes e nos montes e lagos se meneiam com vagares
reais.
Começo a escrever para que o
desejo de palavra permaneça. Pressinto esse tempo urdido por artesões de
espera, monstros pacientes do interminável desperdício. E num dia assim triste e
aconchegado, bebendo os trilhos que passam no meu cérebro, entardeço comigo a
trovoada que vai fazer-se ao mar.
Passeio pela casa,
atento sobretudo aos campos, como se ali pudesse haver um momento de sombra e o
encontro da hora morta.
Há nuvens altas, o
campo oscila sob o céu líquido e cinzento e a trovoada desce sobre o pequeno
devaneio de Verão. E assim enrodilhada e abrupta e próxima da explosão, regressa
inutilmente comigo àquelas tardes de Setembro em Santo Amaro.
De joelhos, como
um pastorinho rezando a eternidade do fogo às alturas de Santa
Bárbara.
* ( do livro Linha Mágica)
* ( do livro Linha Mágica)
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